Reputação manchada: Você voaria em um Boeing 737 MAX?

 

A pergunta acima foi feita a milhares de viajantes das principais companhias aéreas do mundo a pedido da Boeing, a fabricante dos aviões. O resultado da enquete foi duro: apenas cinco em cada dez entrevistados embarcaria com tranquilidade no modelo, versão modernizada do avião mais popular e lucrativo da empresa, o 737.

Realizada no dia 9 de dezembro e divulgada na véspera do Natal pelo jornal The New York Times, a pesquisa reflete a mais severa crise de imagem vivida pela Boeing. “A preocupação com os problemas do modelo 737 MAX, de modo geral, é alta em todos os países”, concluiu a empresa a partir dos dados. No epicentro da tempestade estão as quedas de dois aparelhos novos (na Indonésia e na Etiópia), resultando em 346 mortes — e a maneira como a Boeing reagiu aos acidentes.

A conduta dos executivos da empresa depois do primeiro acidente, em novembro de 2018, foi um misto de negação com doses de má-fé. Na época, chegou-se a insinuar que a perda de controle da aeronave, operada pela empresa indonésia Lion Air, foi causada por erro da tripulação. Tal posicionamento não mudou quando o segundo acidente aconteceu em março, com um avião da Ethiopian Airlines, em circunstâncias muito semelhantes.

O sinal vermelho só acendeu quando as investigações internacionais apontaram que havia falhas no software de controle de voo e que tais defeitos tiveram peso decisivo nas tragédias. Com a notícia, a China determinou a paralisação dos voos dos mais de 100 modelos MAX em operação no país. Centenas de companhias aéreas do mundo inteiro (entre elas a brasileira Gol), corroboraram a decisão e estacionaram seus MAX.

Pressionada pelos órgãos de fiscalização da aviação comercial, a Boeing levou longos meses para reconhecer a falha e tomar medidas mais severas para conter a crise. Apenas no dia 17 de dezembro paralisou a produção na fábrica onde os 450 aviões já entregues foram montadores e outros 400 aguardam para serem entregues. E foi só na segunda-feira (23) que demitiu seu presidente global, Dennis Muilenburg, responsável pela resposta errática aos problemas.

A conduta dos executivos da Boeing frente aos acidentes foi um típico caso de arrogância e cegueira corporativa. Em um roteiro que mistura pressão política e econômica sobre o órgão regulatório de aviação dos Estados Unidos (a empresa é a maior exportadora do país), sonegação de informações a empresas clientes, insensibilidade com familiares das vítimas e prepotência frente às proprietárias das aeronaves acidentadas, a Boeing cometeu todos os erros possíveis.

Mesmo quando surgiram evidências de falhas no sistema digital de controle de voo, a empresa continuou a alegar que era um problema menor e não havia necessidade de paralisar as operações das aeronaves já entregues — a brasileira Gol, por exemplo, tem sete aviões e outros 17 a receber. Segundo o comunicado da Boeing em que foi anunciada a demissão de Muilenburg, a mudança na cúpula da empresa foi destinada a “restaurar a confiança na companhia assim como à reparação de seu relacionamento com os órgãos reguladores, clientes, funcionários, fornecedores e acionistas”. Pelos resultados da pesquisa divulgadas na véspera do Natal, a empresa tem uma trabalheira enorme pela frente.

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