Psicopatas: mentes que matam

Procurando em meus livros da estante, o clássico “A origem das espécies” de Charles Darwin, não me contive e logo comecei a folhear outros livros que por um tempo estavam apenas guardados pois em algum momento foram extremamente úteis para mim. Folha vai e folha vem, encontrei o filme “Copycat – a vida imita a morte” de 1995. Nele, Helen Hudson, psiquiatra criminal, analisa o perfil de Serial Killers. Embora o final do filme foi trágico, a protagonista conduzia muito bem sua pesquisa, baseada nas ferramentas disponíveis naquele contexto. Quando assisti eu também estava estudando o comportamento psicopata para fazer uma apresentação na Universidade Federal de Alagoas. No dia 20 de fevereiro, houve a 26º condenação (46 anos), do vigilante de Goiás, pelo assassinato de um casal de adolescentes em julho de 2014. Tiago, que responde a 30 assassinatos, é famoso no país, sendo considerado um dos Serial Killers mais conhecidos do mundo; isso me direciona a redigir este texto o qual falarei sobre o comportamento psicopata.

Psico significa mente e pathos significa doença, dessa junção resulta a palavra psicopatia, doença mental; mas para analisarmos este comportamento precisamos antes definir o que é doença mental (Sugiro a leitura do texto “afinal, o que é transtorno mental?”). Os transtornos mentais, como são conhecidos, podem ser definidos como padrões de comportamento que diferem dos comportamentos típicos de determinada sociedade, em geral, são comportamentos problema porque há um excesso ou déficit no repertório do organismo. Uma pessoa que emite comportamentos de depressão, por exemplo, sinaliza um deficit em seu repertório para lidar com algumas situações inerente a nossa existência. Uma pessoa que alucina e/ou delira, por exemplo, sinaliza um excesso em seu repertório. No entanto, há controvérsias entre os defensores das teorias genéticas, pois eles próprios não concebem a psicopatia como doença mental, mas uma condição de ser onde o racional é mais forte que o emocional, por esta razão essas pessoas legalmente são inimputáveis em algumas sociedades, ou seja, não podem responder aos crimes porque são “portadores de um distúrbio”.

O comportamento do psicopata pode ser analisado como qualquer outro comportamento em interação com o ambiente. Embora haja disposições genéticas para determinados comportamentos, é no ambiente que alguns circuitos neurais pré-formados se fortalecem e o padrão comportamental de fato se concretiza. Dessa forma, faz-se relevante avaliarmos funcionalmente o comportamento de maltratar o outro em prol do benefício próprio. Filogeneticamente, possuímos estrutura para violentar qualquer estímulo de ameaça a nossa existência, nascemos com a disposição para a violência, mas nossa interação com o meio nos ensina a bloquear determinados comportamentos em vista da punição que receberemos. Por exemplo um pai que tem sua filha de 5 anos estuprada, naturalmente emitirá comportamentos violentos contra o agressor. Algumas pessoas possuirão esta estrutura mais fortalecida que outras, decorrente de sua história de reforçamento e punição envolvendo também ontogênese (história de vida pessoal) e sociogênese (cultura em que está inserido), a punição muitas vezes é pouco relevante se comparada com a impulsividade na hora de violentar; mas comportamentos complexos só são emitidos quando antes houveram ensaios em pequenos comportamentos que indicavam possibilidade de um comportamento maior. Digo isso, levando em consideração o histórico de falta de punição e desvalorização de comportamentos mais benéficos dessas pessoas quando em idades mais jovens. Um ambiente em que faz pouco caso e valoriza uma criança que maltrata um animal de estimação, é suficiente para fortalecer repertórios de apatia com o outro. Um adolescente que é valorizado pelo grau de periculosidade dele no ambiente escolar é suficiente para formar um adulto pouco sensível a dor do outro. O diagnóstico de psicopatia (Idade mínima: 18 anos), feito por um psiquiatra apenas indica que essas pessoas violentas não devem ser punidas, e isso indica mais um benefício para continuar usando as pessoas para se satisfazer, mesmo que isso custe a vida delas.

Em termos de neurologia, o cérebro do psicopata funciona de modo diferente de pessoas não psicopatas, principalmente numa área chamada de sistema límbico, a qual é responsável por processar as emoções humanas. É um sistema complexo e também tem funcionalidade para outros mecanismos do organismo, por isso é incorreto afirmar que o sistema límbico do psicopata está desativado. Fato é que existe pouca atividade nesse sistema frente a situações que normalmente as pessoas se emocionam. Por esta razão, psicopatas são definidos por outros autores como pessoas sem “empatia”, adjetivo ao qual nos referimos ao comportamento de sensibilizar-se emocionalmente pelo outro. Essas pessoas, geralmente não sentem culpa ao cometer determinado crime, para alguns, “matar” pode ser a mesma coisa de “brincar”. Ressalto que para “alguns”, justamente porque psicopatia não necessariamente está associada a assassinatos (semelhante aos Serial Killers que estamos habituados a adjetivar). Na verdade, este comportamento pode ser classificado como egoísta, onde apenas o benefício próprio prevalece, mesmo que para isso, seja necessário matar alguém para satisfazer determinado desejo. Pesquisas já realizadas com pessoas que cometeram crimes em séries confirmam um sistema límbico defeituoso, no entanto não há comprovação do funcionamento desse sistema anos antes do diagnóstico de psicopata, com isso é inviável abraçar a teoria de que estes cérebros não foram modelados para terem essa estrutura. Chamamos isso de ‘plasticidade neural’, onde circuitos são formados e fortalecidos a medida em que emitimos determinado comportamento, bem como, existem estruturas que são enfraquecidas a medida em que deixamos de emitir determinados comportamentos, ao qual chamamos de treino.

Escrevo não para abandonarmos os modelos genéticos da psicopatia, mas para também levarmos em consideração a história de formação das pessoas em interação com o ambiente. O behaviorismo radical, contempla uma análise empírica de que o que somos hoje, é resultado de filogênese, ontogênese e sociogênese, sendo possível compreender o organismo em sua totalidade. Precisamos promover ambientes cada vez mais capazes de nos preparar para enfrentarmos as eventualidades da vida, aprendendo a superar frustrações, trabalhando o autocontrole e ampliando um repertório de vida em comunidade, onde o desejo de uma única pessoa não prevaleça sobre as outras. Analisar por que nossos filhos emitem comportamentos violentos e ensiná-los a serem mais assertivos, preparando-os para adquirirem os ‘valores’ de uma cultura, já é o começo de uma educação não formadora de pessoas insensíveis para com o outro.

 

Diego Marcos Vieira da Silva

Graduando em Psicologia pela Universidade Federal de Alagoas

 

6 comentários sobre “Psicopatas: mentes que matam

  1. Que tema importante esse Diego Vieira. Conheço casos sobre isso e sempre acreditava que a causa era só genética, mas agora VC esclareceu melhor

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