Por que é tão difícil mudar?
Certa vez voltando para casa depois de um dia de trabalho cansativo, ouvi uma senhora falando de sua “insistência” em recomeçar dietas às segundas-feiras para tentar chegar ao corpo desejado, mas não conseguia. Quando assim o fazia, de início estava tudo em ordem, conforme planejado, porém hábitos antigos voltavam a aparecer e ela emitia os comportamentos que causaram-lhe prejuízo mais uma vez. A outra amiga, por sua vez ouvindo essa senhora, afirmou que cansou de pedir para o esposo mudar comportamento para com ela, mas ele sempre volta a causar transtornos a ela, se comportamento de maneira inadequada. Ambas as senhoras, amigas, tinham por volta de 30 ou 35 anos e buscavam desesperadas uma fórmula para concentrar-se naquilo que tinham como propósito executar.
Como nós, cientistas do comportamento, podemos contribuir de maneira eficaz para amenizar os problemas aqui expostos, partindo da abordagem analítica comportamental? Responder a esta pergunta me remete aos estudos da época da graduação, quando eu estava tendo contato com os primeiros estudiosos do comportamento humano e me deleitando com os conceitos tão complexos que dificultava o entendimento de meu pobre intelecto outrora. Como podemos causar motivação nas pessoas? Como é possível tornar algo não habitual, com algo de costume nas relações que estabelecemos com nosso ambiente? Voltamos, com isso ao ano de 1953 quando B. F. Skinner divulgava um de seus livros mais importantes e que contribui para a formação de psicólogos até hoje: ciência e comportamento humano. O livro lançava bases para entendermos todo comportamento humano, dos mais simples ao mais complexo. Conforme a ciência fundada por este importante cientista, todo comportamento só “se mantém se estiver sendo reforçado”, tá ai um dos mandamentos do behaviorismo radical. Compreender “reforço” não é tão difícil: basta pensarmos em algo que motiva o sujeito a continuar emitindo o comportamento, por exemplo um elogio do tipo “nossa, como você está mais bonita”, um presente seguido por “adorei sua forma de se relacionar comigo hoje” ou até mesmo quando eliminamos algo desconfortável, como quando folgamos o cadarço do tênis porque nus causava desconforto. A mulher que falava para outra sobre suas dificuldades pessoais estava sendo reforçada pela escuta e atenção da outra colega.
Ainda assim, pareço não está sendo claro, caro leitor, quando coloco sob uma simples frase, coisas tão complexas pelas quais nos rodeiam todos os dias. Simples: precisamos analisar o que nos motiva para mudar, uma vez analisado, precisamos encontrar quais os “reforçadores” que nos auxiliarão nessa mudança. Claro que para isso, teremos que estabelecer reforçadores bastante alto para este auxílio. Por exemplo, um dia de sol na praia com um belo almoço com frutos do mar é comparativamente mais reforçador que ficar vendo tv em casa, comendo comida requentada da semana passada. Haja vista que haverão pessoas que acharão o segundo mais reforçador que o primeiro, a depender de seu estilo de vida, por isso que a análise do que nos motiva é bastante subjetiva e cada pessoa tem motivações que são muito particulares (Um elogio do marido, por exemplo é muito mais prazeroso para alguns do que uma quantia em dinheiro a mais no seu salário, fim do mês). O trabalho do cientista do comportamento estará justamente no mapeamento de reforçadores e análise do ambiente do sujeito para eliminar possíveis fontes que podem prejudicar o resultado final.
Quando trazemos o assunto para a discussão levantada no início do texto, temos algo a refletir: no primeiro caso, a senhora está em um ambiente que reforçam o contrário do que ela busca, onde pessoas emitem comportamentos pelos quais ela tem buscado evitar, bem como essas pessoas elogiam e valorizam quando esta senhora também emite os mesmos comportamentos em grupo, diferentemente se fosse um ambiente em que todos fazem dieta e falam dos benefícios, ignoram pessoas que não fazem a dieta, bem como dão mais atenção aos assuntos relacionados a saúde e ao corpo. Com isso, estou querendo dizer que muitas vezes aquilo que traçamos como objetivo em nossa vida não condiz com a realidade que vivemos e se mesmo assim esta senhora consegue focar em seu objetivo, isso denota que para ela existe um reforçador muito maior nessa balança: evitar doença e envelhecimento precoce, por exemplo, frente a uma sociedade que valoriza cada vez mais a pessoa mais jovem e mais magra. Segundo Pires e Santos (2012) “É preciso que o sujeito diminua sua exposição às condições que facilitam a alimentação inadequada”, ou seja ampliar o leque de possibilidades que ajudem o sujeito ao foco pretendido também contempla conhecer esses ambientes que o sujeito frequenta e quais os comportamentos que lá são valorizados. Ao nível psicoterápico, no tratamento de pessoas que querem emagrecer, as técnicas comportamentais que são mais utilizadas, segundo Pires e Santos (2012) são: a reestruturação cognitiva (o paciente faz uma reavaliação e correção de suas cognições distorcidas, permitindo assim que ele possa perceber que, na maioria das vezes, estava desvalorizando sua capacidade de enfrentamento de determinada situação), treino de assertividade, exposição e prevenção de respostas. Vale lembrar que estas técnicas devem ser adaptadas de acordo com cada pessoa, depois de um estudo detalhado das variáveis envolvidas no padrão de resposta do sujeito. Uma vez instalados os novos padrões de comportamento, a manutenção deve ser feita e o trabalho multidisciplinar se faz importante.
No caso da outra colega desta senhora que estava falando sobre as insatisfações com as vezes que tentou modificar o comportamento do esposo precisa levar em consideração pontos chave nessa mudança: o que motivaria seu esposo a mudar seu comportamento? Você mudaria hábitos junto com ele? Quais os ambientes que seu marido frequenta que provavelmente ajudariam nessa mudança comportamental? Precisamos evidenciar que as pessoas precisam de motivação para mudar o comportamento e esta mudança parte do ambiente onde o sujeito está; e por ambiente não me refiro ao concreto e palpável, mas toda a rede de relações que o sujeito tem com as pessoas, bem como seus pensamentos, muitas vezes desajustados quanto a sua própria realidade. Acredito que modificar o comportamento do outro está a um nível tão difícil quanto modificarmos o nosso, pois não temos controle total dos ambientes que o outro frequenta, por outro lado, podemos enquanto pessoas a sua volta facilitar essa mudança comportamental modificando relações e hábitos no nosso próprio ambiente. Vale lembrar, também, que muitas vezes um ambiente totalmente aversivo e repressor (punidor) foram operações estabelecedoras de pessoas que resolveram levantar e mudar sua realidade melhorando sua condição de vida, ou seja a modificação do comportamento também pode partir de uma história de insucessos na vida da pessoa; mas nem sempre é assim. Nem todo mundo tem pré-disposição para agir dessa forma, e isso dependerá da história de cada um.
No mais, o psicólogo analista do comportamento tem todo um aparato teórico-prático que facilita na análise dos dados e interpretação de qual seja a melhor saída para ajudar uma pessoa que quer modificar seus hábitos. Neste texto, busquei apresentar muito resumidamente como que cada pessoa pode melhorar sua qualidade de vida, buscando compreender seu ambiente e as relações que estabelece diariamente. Aderindo a novos hábitos mais saudáveis de vida, você também estará construindo a adesão de novos repertórios comportamentais suficientes para mantê-los. As pessoas mais bem-sucedidas foram aquelas as que tiveram a “capacidade de estar em ambientes com contingências adequadas para se organizar e traçar planejamentos para sair de uma situação de risco ou vulnerabilidade social” (Silva, 2012).
Diego Marcos Vieira da Silva
@PSICODIEGOVIEIRA
Psicólogo analista comportamental CRP15/4764