Quem é você na hora da dificuldade?

Enquanto seres humanos compartilhamos bastante aprendizado com nossos iguais, seja aquele passado de um para o outro através do discurso verbal dos pares, seja através de observação do comportamento do outro, ou até mesmo vivenciando o evento em si. O termo aprendizado está sendo usado nesse sentido para se referir a emissão de comportamento para resolução de alguma eventualidade. Sim, pois todo comportamento nosso emitido é resultado de uma aprendizagem, desde o andar, até o comportamento de tomar decisões. as eventualidades pelas quais passamos sejam elas boas ou ruins, tem como resultado garantir a instalação ou manutenção de um comportamento, seja ele adequado ou não e a maneira como enfrentamos as dificuldades dizem muito sobre nós, pois são através delas que o homem torna-se vulnerável ou não aos hábitos de comportamento que garante uma pessoa mais ajustada e inteligente comportamental e cognitivamente ou uma pessoa frágil e com atributos que tendem à depressão e outros transtornos psicológicos.

No texto a seguir, escrito por Gerson Alves, psicólogo e  analista do comportamento e professor de psiconeurobiologia da Universidade Federal de Alagoas, o autor relata uma experiência com seu filho que nos convida à reflexão sobre nossos atos que favorecem padrões mais fortes em nossos filhos ou mais problemáticos. Vejamos.

Quem tira as formigas de cima de você?

Era uma segunda-feira como outra qualquer, já era noite e eu estava de saída para ir dar aulas. Havia fechado o portão quando meu filho, com apenas três anos, vem correndo como sempre fazia e diz: tchau papai! Eu vou me afastando enquanto continuo a ouvir os tchaus de meu filho Arõatan. Ainda não estava longe quando ouvi um grito de desespero e dor. Sem dúvidas eram do menino, algo havia acontecido no portão e eu voltei rapidamente. Quando cheguei à frente da casa, lá estava Arõatan que não parava de gritar exageradamente. A tia dele vinha correndo angustiada para socorrê-lo. Procurei entender o que estava acontecendo e logo percebi que ele era atacado por formigas saúbas, chamadas também de formigas de roça. Neste momento, mais rápido do que a corrida da tia para ajudá-lo, eu gritei: PARE! A tia dele tenta argumentar dizendo que as formigas o estão atacando e ele precisa de ajuda. Eu olho firmemente para o menino que grita em desespero e digo: SILÊNCIO! E logo em seguida continuo: Gritar vai resolver seu problema Arõatan? Ele então olha para mim e diz: Não! Eu prontamente emendo: O que vai resolver seu problema? Ele começa a retirar as formigas uma a uma do corpo ao passo que se afasta do local em que as formigas estavam. Sua tia, nesse momento completamente indignada, diz: Toda vida eu andei em aldeia e nem lá vi uma brutalidade dessas.

Seria muito mais fácil e aparentemente mais afetuoso para mim e para o Arõatan socorrê-lo ou permitir que sua tia o fizesse ao invés de solicitar uma solução dele que na época contava com apenas três anos de idade. Uma das coisas boas que recordo vivamente na relação com meu pai era que as proibições quase não existiam, mas todas as consequências de meus atos precisavam ser respondidas por mim. Isso me fez entender claramente que não preciso deixar de fazer algo simplesmente porque alguém concebe errado ou proíbe. Mas, preciso antes sim ver minha capacidade de arcar com as consequências. Arõatan não estava respondendo por nenhuma consequência de uma atitude errada que ele havia tomado. Arõatan estava sendo atacado simplesmente por ter atravessado o caminho das formigas que precisavam trabalhar. Eu também precisava trabalhar do mesmo modo que as formigas e por razões semelhantes. Mas, antes precisava mostrar ao Arõatan que não recorremos aos outros antes de tentar desenvolver nossas habilidades de resolução dos problemas que nos metemos.

Arõatan ainda é criança, mas as formigas lhe marcaram. Espero que essas marcas sirvam para desenvolver habilidades suficientes de retirar todas as formigas que subirem nele ao longo da vida. Espero poder ajudá-lo também quando suas forças não forem suficientes para sair da situação. Mas, pelo próprio ciclo natural da vida ele continuará depois de mim, espero então que quando isso ocorrer ele continue enfrentando formigueiros maiores e mais cortantes. Chorar, gritar ou culpar os outros pode ser eficiente e resolver seus problemas, mas acredite um dia as formigas lhe atacarão sem que ninguém esteja por perto para socorrer. Se for o caso mude de postura como fez Arõatan e depois arranque uma a uma as formigas de você. Desenvolva a habilidade de retirar as formigas enquanto seu pai lhe observa. Para ser capaz depois de enfrentar as formigas sozinho.

Assim eu fiz, assim eu conto pra vocês.

 

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